Homenagem na Flip faz editoras investirem em obras de Lima Barreto
Prateleiras com livros de Lima Barreto, e sobre ele, na Livraria da Travessa de Paraty – Mônica Imbuzeiro
Na Livraria da Travessa montada especialmente para a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), as obras de Lima Barreto se multiplicam, num reconhecimento que o autor nunca teve em vida. A razão para a profusão de publicações é simples: toda a obra do autor entrou em domínio público em 2002, 80 anos após a sua morte, de acordo com a legislação brasileira. Em 15 edições da Flip, esta é apenas a segunda em que um autor em domínio público é homenageado. Antes de Lima, só Machado de Assis, reverenciado em Paraty em 2008, podia ser publicado livremente.
Na corrida para aproveitar o burburinho gerado pela festa em torno da obra do escritor, cada editora apostou numa leitura diferente de sua obra. A Carambaia, casa paulista que há dois anos vem se destacando por publicar edições caprichadas de obras em domínio público, decidiu investir na reedição de dois romances menos lembrados de Lima: “Os bruzundangas” e “Numa e a ninfa”.
Ambos foram publicados originalmente como folhetins, em jornais da época. Suas edições originais eram muito simples e basicamente aproveitavam as chapas montadas para imprimir os textos no jornal. A editora Graziella Beting, da Carambaia, explica que os jornais foram a inspiração do projeto gráfico concebido pelo designer Fernando Vilela, que fala hoje na Casa do Papel, (Av. Otávio Gama 142) às 13h30m.
— O Fernando enlouqueceu com essa história de ter saído no jornal e foi à Biblioteca Nacional ver os originais onde foram publicados — conta ela.
Graziella explica que o fato de a obra ser de domínio público não torna a edição mais fácil. A própria fixação do texto é difícil, já que os jornais do início do século XX vinham com muitos erros, as chamadas “gralhas”. Na Biblioteca Nacional, onde está depositado o arquivo de Lima Barreto, ficam os originais anotados dos dois romances. Mas mesmo isso provoca discussões. A solução encontrada foi recorrer a uma especialista, a crítica Beatriz Resende, que assina a organização e posfácio.
— O processo de edição é também uma forma de interpretação da obra — diz Graziella. — Agora, esses textos estão sendo editados como clássicos.
Já a Autêntica preparou a edição de uma seleção de crônicas de Lima Barreto sobre o Rio de Janeiro, também organizada por Beatriz Resende, “Lima Barreto — Cronista do Rio”. A editora Maria Amélia Mello conta que a casa já preparava a reedição da biografia “A vida de Lima Barreto”, de Francisco de Assis Barbosa, e queria fazer algo especial para a Flip. A proposta do livro surgiu a partir da própria Beatriz.
— Já tínhamos reeditado o “Lima Barreto e o Rio de Janeiro em fragmentos” e estávamos pensando em algo para a Flip. Ganhamos um edital da Biblioteca Nacional e fizemos essa parceria para publicar fotografias históricas da cidade que estão no acervo da instituição — conta Maria Amélia.
Já a Global Editora aproveitou a homenagem a Lima na Flip para colocar na rua “Lima Barreto para jovens”, uma seleção de crônicas destinados a adolescentes. A série “para jovens” já publicou vários autores, como Marina Colasanti e Ignácio de Loyola Brandão. O editor Gustavo Henrique Tuna explica que, para selecionar os 29 textos, o critério foi buscar os que ainda soam atuais.
— Há crônicas sobre política e sobre as reformas urbanas que podem ser lidas hoje tranquilamente, mantêm uma atemporalidade. Por exemplo, quando o Lima fala das mudanças no Rio de Janeiro. A cidade passou por outra reforma urbana recentemente. O jovem pode se surpreender — afirma Tuna.
Já a Penguin-Companhia, que vem reeditando toda a obra do escritor há alguns anos, preparou para a Flip novas edições de “Numa e a ninfa” e “Impressões de leitura e outros textos críticos”, todas comentadas. Tem-se, assim, um múltiplo Lima nas livrarias: do cronista do Rio ao autor que ganha um tratamento editorial destinado aos clássicos de capa dura. As novas edições dos seus romances ganham prefácios, ensaios e comentários inéditos, gerando um movimento de renovação na recepção de sua obra. Mais de cinco décadas após Francisco de Assis Barbosa fazê-lo renascer com a edição de suas obras completas, as leituras de Lima vivem, em 2017, um recomeço.
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