O maior ladrão de livros raros do Brasil
aéssio Rodrigues de Oliveira está na prisão pela 5ª vez por furtos de livros e desenhos – como obras de Debret e Rugendas – de museus e bibliotecas; sua história é tema de documentário.
*Publicado no Terra [via BBC Brasil]
Eu só vi Laéssio chorar em duas ocasiões. A primeira foi por raiva, quando um cliente fechou a porta em sua cara e ele, sem dinheiro para comprar sequer um sapato novo, sentiu-se humilhado. Já a segunda foi por amor – ao ler uma carta com um pedido de casamento enviada pelo namorado, detido em um presídio no Rio de Janeiro. Na maior parte do tempo, Laéssio não é de se lamentar. Um senso de humor abusado é seu traço mais marcante.
Considerado pelas autoridades brasileiras o maior ladrão de livros raros do país, Laéssio Rodrigues de Oliveira entrou na minha vida em uma tarde de setembro de 2012, quando recebi uma ligação a cobrar vinda do complexo penitenciário de Bangu, na zona oeste da capital fluminense, com um pedido insólito: um exemplar da biografia de Carmen Miranda escrita por Ruy Castro. “Essa história toda começou por causa dela”, resumiu.
O telefonema era uma resposta à primeira das dezenas de correspondências que trocaríamos ao longo das temporadas esparsas que Laéssio passaria em cadeias de São Paulo e do Rio de Janeiro. Desde 2004, ele já deu entrada cinco vezes no sistema prisional. Ao todo, contabiliza quase uma década atrás das grades, sempre acusado do mesmo crime: pilhar acervos de Norte a Sul do país à caça de todo tipo de papel antigo de alto valor.
O leque de obras furtadas atribuído a Laéssio impressiona pela raridade e pela variedade. Vai das fotografias do funeral de Dom Pedro 2º, inclui um dos primeiros atlas do Brasil feito por um cartógrafo holandês do século 17 e passa por primeiras edições autografadas por cânones da literatura nacional. O crème de la crème das obras roubadas, no entanto, são os originais de desenhos feitos por artistas como o francês Jean-Baptiste Debret e o alemão Johann Moritz Rugendas, que no século 19 viajaram o país para retratar paisagens e personagens do Brasil colonial. Hoje, um álbum completo de Debret, por exemplo, não sai por menos de US$ 300 mil.
Desde março deste ano, Laéssio está preso no Rio de Janeiro, depois de ser condenado em primeira instância na Justiça Federal a mais dez anos e sete meses de prisão pelo furto de obras raras do Museu Nacional e do Museu Histórico Nacional, também no Rio. Ainda cabe recurso.
Dinheiro
“Minha história toda foi pobre. Ser rico é bom. É ótimo. Não estou falando ‘ser riquíssimo’, como esse povo que fica rico demais e aí vira essa palhaçada, essa desigualdade do c*ralho. Mas ser independente, morar bem, fazer o que quer, entendeu?”
Num intervalo de duas décadas, Laéssio trocou o anonimato do balcão de uma padaria em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, pelas manchetes de jornais de todo o país. Montou três bancas de antiguidades e um sex shop batizado de Mae West em homenagem à atriz americana que “era tipo a Dercy Gonçalves”, segundo ele. Também se especializou em Biblioteconomia e fez negócios com gente graúda.
Laéssio não ficou milionário, mas ganhou dinheiro suficiente para comprar um confortável apartamento no Largo do Arouche, no centro de São Paulo. Também se permitiu pequenos luxos, como vestir um terno Armani, passear com o ex-marido a bordo de um Audi A3 ou de um Chrysler PT Cruiser e custear um imóvel no Guarujá, litoral paulista.
“Eu vivia num mundo encantado. Eu era uma bicha louca, desvairada, achava que aquilo nunca iria acabar, que nunca iria dar problema”, confessa. Entretanto, torrou tudo tentando acertar as contas com a Justiça.
Desde aquela primeira ligação a cobrar que Láessio me fez em 2012, acumulei – além de incontáveis cartas – pilhas de processos judiciais, dezenas de horas de gravação e centenas de páginas de anotações feitas durante entrevistas em diversos locais, incluindo duas penitenciárias. Laéssio só topou me confidenciar sua história para que ela não ficasse encarcerada nas colunas policiais. “Eu não matei ninguém, cara. Vou me arrepender de quê? De que adquiri um monte de livro velho?”
‘O que é que a baiana tem?’
A mãe de Laéssio é uma senhora miúda de 62 anos que trabalha passando roupa e cuidando de idosos. Ela tem o costume de concluir as frases com um simpático “num sabe?” carregado de sotaque nordestino. Refere-se ao mais velho dos seis filhos – que criou sozinha a partir dos 31 anos de idade – como “Grandaião”, apesar de a compleição física de Laéssio nem de longe botar medo em quem quer que seja. “A família não quer nem saber desse assunto. É uma pena”, lamenta, antes de cair num choro envergonhado.
Laéssio nasceu em Teresina, em 15 de janeiro de 1973. Ainda criança de colo, mudou-se com a família do Piauí para São Bernardo do Campo. O pai trabalhava como eletricista. Quando bebia, costumava bater na esposa e era confrontado pelo primogênito, cujos trejeitos tiravam seu sono. O menino até chegou a ser levado a uma consulta médica para corrigir o suposto desvio. Mas não adiantou: depois que o pai morreu atropelado em uma rodovia, Laéssio saiu do armário, aos 15 anos de idade.
A mãe conta que desde muito cedo Laéssio era fissurado por gibis e jornais – inclusive, tinha o costume de empilhá-los no meio da sala. “Ele é muito inteligente, conversa sobre qualquer assunto”, diz. De fato, Laéssio é capaz de discorrer por horas em tom professoral sobre cinema, música e todo tipo de arte vintage.
Foi uma obsessão adolescente pela atriz e cantora Carmen Miranda que levou Laéssio a mergulhar no universo dos papéis antigos. Depois de escutar O que é que a baiana tem? pela primeira vez no rádio, decidiu colecionar tudo o que estivesse ao seu alcance sobre a artista. “Talvez seja aquilo que ela mesmo diz na música: ‘tem graça como ninguém’. Aquela brejeirice, como Dorival Caymmi disse uma vez, me dominou”, explica.
Para alimentar a compulsão de fã, Laéssio passou a furtar. O primeiro crime aconteceu no Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo. Ao colocar os pés na biblioteca da instituição, nem precisou vasculhar as estantes. Seu olhar foi instantaneamente capturado pelo sorriso de Carmen Miranda estampado na capa de uma revista Fon Fon da década de 1940, em cima de uma mesa. Com a adrenalina a mil, certificou-se de que ninguém o vigiava, enfiou o exemplar na mochila e saiu andando.
“Aí comecei a minha peregrinação pelas bibliotecas. Tudo que era revista com a Carmen Miranda na capa eu saí levando. Comecei a ter paixão por aquilo”, relata.
Por volta de 1996, Laéssio conheceu seu primeiro cliente, Abel Cardoso Júnior, falecido escritor radicado em Sorocaba (SP) e autor de A Cantora do Brasil , biografia menos badalada da artista. “Vendi todo meu acervo para ele. Larguei um emprego na prefeitura para viver disso”, relembra.
O primeiro problema com a polícia também remonta a essa época. Certa vez, enquanto enchia a bolsa com revistas antigas no Arquivo Geral do Estado de São Paulo, foi flagrado por seguranças e conduzido a uma delegacia. Acabou liberado depois de gabaritar um quiz sobre Carmen Miranda feito pelo delegado e de jurar em vão que jamais voltaria a surrupiar uma biblioteca.
Comércio
Eis que Laéssio resolveu empreender: comprou uma barraca na Feirinha do Bixiga, tradicional reduto de colecionadores de antiguidades em São Paulo, e fez sociedade com o dono de uma banca de revistas pornôs na esquina das avenidas Ipiranga e São João. Seu métier eram publicações antigas sobre cinema, como Cena Muda e Cine Arte, e jornais com manchetes sobre a proclamação da República e a abolição da escravatura.
Além de atrair personalidades, como o ator John Herbert e o cineasta Zé do Caixão, as bancas de Laéssio também passaram a ser frequentadas por funcionários de bibliotecas oferecendo antiguidades de procedência duvidosa. “Eu não vou ser hipócrita: tinha coisas que eu estava comprando que sabia que eram roubadas”, afirma. Laéssio, então, sentiu a necessidade de diversificar os canais de venda. Aconselhado por clientes, resolveu desbravar leilões de papéis raros. “Uma vez, paguei R$ 10 num leque de carnaval dos anos 1930 na Feirinha do Bixiga, depois coloquei no leilão e ele foi vendido por quase R$ 500”, exemplifica.
No começo dos anos 2000, um dos mais prestigiados leilões era o da extinta livraria Universal, no centro do Rio de Janeiro. Criada por Joaquim Monteiro de Carvalho, empresário que participou da fundação da Klabin e das negociações que trouxeram a Volkswagen para o Brasil, a Universal era um convescote de amantes das artes dispostos a investir pesado em obras exclusivas.
“Eu comprava coisas na Feirinha do Bixiga e ia levando para a Universal. Aí, um dia o gerente me falou: ‘por que você não coloca livros? Dá mais dinheiro!’ Eu respondi: ‘pô, eu não entendo de livro, não'”, narra.
Aquela conversa representou uma virada na vida de Láessio. Para subir o sarrafo dos negócios, chegou à conclusão de que precisava se capacitar. “Foi por isso que eu fui fazer Biblioteconomia. Porque eu queria minha parte em ouro”, interrompe a si próprio com um sorriso de canto de boca pelo ato falho. “Em ouro, não… em livro velho, tá entendendo?”
Quando fala da Universal, Láessio se expressa em um tom que mescla nostalgia e deslumbre. “Era passatempo de gente rica. Lá, eu me sentia madame”, define. De fato, o perfil dos colecionadores que circulavam pelos leilões era tão refinado quanto ecumênico. Lá, podia-se cruzar com George Ermakoff, ex-presidente da companhia aérea Rio Sul; Jorginho Guinle, playboy de ofício e suposto affair de Marilyn Monroe; Manoel Portinari, sobrinho do célebre pintor modernista e fanático pelo poeta Manuel Bandeira; Pedro Corrêa do Lago, bibliófilo e ex-presidente da Biblioteca Nacional; e Ruy Souza e Silva, captador das obras que compõem a Brasiliana do Instituto Itaú Cultural e ex-marido de Neca Setúbal, herdeira da maior instituição financeira do país.
“Naquela época, os leilões eram presenciais. Dois ou três dias antes, as pessoas examinavam os livros. Não se levava gato por lebre de jeito nenhum”, garante Margarete Cardoso, uma das principais especialistas do mercado de obras raras do país. Por mais de meio século, ela trabalhou na livraria Kosmos, loja de raridades que funcionava no mesmo prédio da Universal, na Rua do Rosário, centro do Rio. “As pessoas iam aos leilões e aí serviam vinho, salgadinho, para ficar uma coisa bem chique mesmo. Mas isso tudo acabou. Com a internet, mudou bastante”, diz.
Fragilidades
Laéssio é relativamente viajado – afirma ter visitado Buenos Aires, Nova York e Paris e sonha com uma cerimônia de casamento em Lisboa. Mesmo assim, tem certeza de que o Rio de Janeiro é o melhor lugar do mundo. “A Mangueira e o Salgueiro precisam de mim, posto que eu me desmando e me transformo ao som da bateria de uma dessas escolas de samba”, ele me escreveu em dezembro do ano passado, quando estava preso em São Paulo pela quarta vez e fazia planos de passar o carnaval de 2017 em sua cidade de coração.
É justamente no Rio de Janeiro que Laéssio deixou mais digitais. Isso se explica pelo fato de a antiga capital federal concentrar os mais importantes acervos com obras de arte e documentos raros sobre o Brasil, como o Museu Nacional, o Palácio do Itamaraty, o Jardim Botânico e a Biblioteca Nacional. Mas ele também é acusado de crimes em outros Estados, como Bahia, Pará, Paraná e São Paulo. Nunca responde sozinho – em geral, é tido como o mentor intelectual de quadrilhas montadas para dilapidar acervos. “Para pegar livro, não é preciso matar ninguém, sequestrar ninguém. Sou alheio a violência, não gosto de violência”, ressalta.
Entretanto, ele já foi condenado por envolvimento com um grupo armado que rendeu funcionários e roubou obras de arte de um centro cultural em Campinas, em agosto de 2013. Apesar de não ter participado diretamente da ação, o processo lhe rendeu sua terceira passagem – de quase dois anos – pelo sistema prisional.
Basicamente, Laéssio é um especialista em furtos. Segundo os inquéritos policiais, suas técnicas variavam de acordo com a ocasião. Passando-se por pesquisador e aproveitando a distração de funcionários, livros e revistas eram escondidos em mochilas ou sob casacos largos. Em caso de obras de dimensões avantajadas, como álbuns de gravuras, páginas eram arrancadas a navalhadas e enroladas como pergaminhos. Subornos a seguranças para facilitar sua entrada também eram um modus operandi comum.
Mas havia também métodos menos ortodoxos – um deles era sugestivamente apelidado de “Efeito Borboleta”. Uma pessoa de corpo delgado e elástico o suficiente para se acomodar em um gaveteiro de biblioteca se escondia dentro do móvel durante horas, aguardando o fim do expediente para sair do casulo e recolher o material previamente selecionado. “Não faltava ar dentro do gaveteiro?”, perguntei espantado a um colega de Laéssio que certa vez me descreveu os detalhes da metamorfose. “Para quem já ficou em solitária na cadeia, isso é moleza”, ele devolveu sem pestanejar.
Na avaliação de Carlos Aguiar, procurador do Ministério Público Federal que conduziu as investigações de uma das duas ações que ainda correm contra Laéssio na Justiça Federal do Rio, sistemas de segurança falhos das bibliotecas, devido a orçamentos apertados, misturados com uma dose de desorganização das instituições, facilitaram os crimes.
“O Laéssio aprendeu a furtar se aproveitando dessas fragilidades”, analisa o procurador. “Eu me lembro que mandei ofício solicitando que adotassem providências. Eles não tinham sequer catalogado o material. Sequer sabiam qual era o acervo que eles possuíam”, afirma Carlos Aguiar, recordando-se do caso específico da Biblioteca Nacional, dez anos atrás.
De lá para cá, segundo o procurador, a série de furtos fez com que os sistemas de segurança das instituições fossem incrementados.
Na biblioteca do Museu Nacional, por exemplo, um retrato de Laéssio – ao estilo faroeste – ainda hoje decora a mesa de vigilantes. Dos arquivos da instituição foram levadas a navalhadas dezenas de gravuras de aves desenhadas pelo naturalista francês Louis Jean Marie Daubenton no século 18.
“Eram coisas maravilhosas”, atesta Alberto Cohen, pioneiro na organização de leilões de papeis raros no Rio de Janeiro. Em abril de 2004, as obras foram arrematadas em um evento organizado por ele no bairro de Ipanema por cerca de US$ 30 mil. Semanas depois, o leiloeiro tomou conhecimento pelos jornais de que as gravuras haviam sido furtadas do Museu Nacional.
“O Laéssio me deu um trabalho danado”, conta entre risos tímidos que abafam ainda mais sua voz rouca. “Eu caí na história dele. Ele me convenceu de que tinha conseguido aquilo na banca de jornal dele. Ele entendia do assunto mesmo”, justifica-se. Alberto, então, procurou a Polícia Federal, devolveu o material e reembolsou os clientes. Porém, afirma não ter recuperado o dinheiro adiantado a Laéssio. “Como todo um-sete-um, vigarista, ele é muito boa gente. Eu não tenho raiva dele, apesar de ele ter me dado um prejuízo louco”, finaliza.
Notoriedade
O jovem estudante Raskólnikov – protagonista de Crime e Castigo , clássico de Fiódor Dostoiévski – construiu uma teoria curiosa para limpar a própria consciência, depois de roubar e assassinar uma idosa agiota. Segundo ele, figuras como Napoleão Bonaparte só se consagraram como extraordinárias porque ousaram correr riscos e até mesmo derramar sangue em nome de ideais de grandeza. Dessa forma, a História – com H maiúsculo – se encarregaria de absolvê-las de eventuais condenações morais.
Feitas as devidas adaptações, o raciocínio de Laéssio bebe da mesma fonte da ética particular de Raskólnikov. “Uma coisa que eu comecei a praticar desde cedo foi a leitura de biografias. Sempre me encantaram as pessoas que vieram para o mundo tanto para o bem quanto para o mal”, introduz Laessio. “Aí eu pensei: Caraca! Será que eu vou vir para a merda deste mundo para passar batido, só para fazer volume?”
Em março deste ano, Laéssio foi detido pela quinta vez depois de ser condenado em primeira instância na Justiça Federal pelo furto de obras raras do Museu Nacional e do Museu Histórico Nacional, ambos no Rio de Janeiro. A sentença foi proferida 13 anos depois dos crimes e o condenou a mais uma década de cárcere. De acordo com a Defensoria Pública da União, que já recorreu da decisão, um dos ilícitos imputados a Laéssio – o furto de revistas antigas do Museu Histórico Nacional – já havia sido considerado prescrito em outro processo e, portanto, não poderia ter sido novamente julgado.
“Laéssio está pagando desproporcionalmente caro, especialmente em relação a outros envolvidos e em relação às penas estipuladas no Código Penal”, afirma o advogado José Carlos Abissamra Filho, que há poucos meses assumiu a defesa de Laéssio. “O que parece é que ele tem sido tratado como bode expiatório de males sociais não atribuíveis a si, o que é, evidentemente, ilegal.”
Um mês após a última detenção, Laéssio entrou novamente no radar da polícia: é o suspeito de um furto na biblioteca da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Depois de fazer um inventário, a instituição divulgou que 303 títulos haviam sido levados de seu acervo, acredita-se, durante uma reforma do prédio em 2016. Dentre as peças subtraídas, há originais dos Sermões do Padre Antônio Vieira e fotos do começo do século passado de índios da Amazônia. O material é estimado em até R$ 500 mil.
A relação de Laéssio com o sistema prisional é um capítulo à parte. Nos cinco anos que passou em Bangu, por exemplo, ele chegou a montar uma biblioteca na penitenciária depois de solicitar doações a diversas editoras. A inspiração veio do trabalho realizado por Dilma Rousseff no período em que a ex-presidente ficou presa durante a ditadura militar. Em agosto, Laéssio virou notícia novamente ao mandar uma carta à direção da Biblioteca Nacional solicitando livros para o presídio em Japeri onde se encontra atualmente detido – o pedido foi revelado na coluna de Ancelmo Gois, no jornal O Globo, com o título “cara de pau”.
Com a bagagem de quase uma década atrás das grades, Laéssio teve de se adaptar à vida no cárcere, mesmo sem beber uma gota de álcool na boca ou usar qualquer tipo de droga, itens tão acessíveis nos presídios. E, por dominar a norma culta da língua e conhecer o Código Penal (cursou a faculdade de Direito por quase dois anos), ele mata o tempo redigindo pedidos de indulto e de progressão de regime para colegas detentos.
Certa vez, referindo-se em tom de brincadeira à significativa população de homens que fazem sexo com homens nas penitenciárias, ele me disse com seu típico ar debochado: “meu medo não é ser preso. Meu medo é ficar pobre. Com dinheiro, a cadeia pode virar a gozolândia”.
Em uma de suas últimas correspondências endereçadas a mim, Laéssio queixou-se de certa perseguição por parte da Justiça e da imprensa: “só me falta ser acusado de roubar novamente o quadro da Mona Lisa, nesses tempos modernos, posto que o mesmo já completou os seus 100 anos que foi furtado pela última vez no Louvre. Mas fique tranquilo que eu jamais orquestrarei tal ação, uma vez que eu já me dou por cansado e velho demais para continuar nessa vida”.
*Carlos Juliano Barros assina com Caio Cavechini a direção do documentário ‘Cartas para um Ladrão de Livros’, que estreia no Festival do Rio no dia 9 de outubro
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